– Da última vez que eu fiz esses bolinhos, ficou bom?
Pausa. Você sabe que a resposta é sim, porque aquela mesma pessoa sempre se derrete em elogios aos tais bolinhos.
– Ficaram...
– Então pode deixar que vou fazer igualzinho.
Para não criar clima, você lança um sorriso que cordialmente diz "a próxima exibição dos meus dentes vai ser no seu pescoço". Recebe em resposta um sorriso "já entendi", e a pessoa finalmente sai da cozinha. Por enquanto.
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Só para esclarecer, a cozinha parece ter se tornado a área de "dê um palpite e seja feliz". Sempre que você começa a cozinhar, surge o ser palpiteiro e começa a te cercar. A cozinha já não é muito grande, e a cada movimento você tem que desviar do seu assistente não requisitado. Sem contar que toda vez você deixa o recinto, todas as panelas são devidamente destampadas e seus conteúdos fiscalizados.
Num dia como outro qualquer, você está lá cozinhando e driblando o público, quando seu público acha que você não está notando e fica realmente em cima de você, quase com o nariz dentro da panela. Outra vez, você não se segura:
– Quer pular aí dentro? – em tom de brincadeira, e com um sorriso de tubarão.
Ainda bem que o público tem levado essas indiretas na brincadeira...
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A cozinha não é o único lugar em que as coisas acontecem, mas ultimamente é onde passo mais tempo, e onde minha paciência parece encurtar-se mais fácil.
Almoço de um dia qualquer, nada de especial. Você já está de saco cheio da nova mania do ser que encanta sua vida culinária: perguntar quantidade de tudo. Se você pergunta se ele também vai querer bife, ele quer saber o tamanho do bife; se você diz que vai fazer arroz e feijão e pergunta se ele também quer, ele pergunta quanto você vai fazer. Por que eu pergunto tudo isso antes de cozinhar? Porque o público aqui é VIP, se eu simplesmente fizer o almoço e alguém não quiser o que eu fiz, a pessoa faz sanduíche, chama alguma coisa por telefone, enfim, come outra coisa e não come o que eu fiz. Eu passei a perguntar antes pra não ficar jogando montes de comida fora depois.
Numa dessas ocasiões, o ser encantador diz que além do que você já ofereceu, ele também vai querer ovos fritos.
– Quantos ovos você vai querer?
– Hum... de que tamanho é o ovo?
– Do tamanho de um ovo aproximadamente.
Dessa vez você responde em tom normal, sem aquela cara cordial de "é brincadeirinha", mas ainda sem agressividade, apesar da sua vontade de rasgar o verbo. A pessoa percebe o ridículo da situação e sorri como se tudo fosse uma piada e diz quanto vai querer.
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Como ninguém senta-se à mesa para comer (a mania é pegar seu prato e dirigir-se para a TV mais próxima), você passa chamando todo mundo quando a comida está pronta. A única pessoa a que você serve é a sua mãe, porque você está paparicando a doentinha. E mesmo nessas condições, isso gera ciúmes paternos. E para mostrar que é independente, o dito cujo fica naquele monitoramento constante do que você faz na cozinha, e do nada vem se servir antes que você chame todo mundo.
– Ih, olha, o feijão está muito sem sal...
– Eu sei. Por isso eu chamo todo mundo só quando a comida está pronta.
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Algumas vezes você fez pão-de-queijo em casa. Não daqueles congelados, nem com misturas prontas, mas a receita tradicional mesmo. Deu trabalho, mas você gostou de fazer, e só não fez mais porque notou que todo mundo come só a primeira fornada e o resto da massa fica estragando na geladeira.
No que você supõe ser uma crise de ócio, o palpiteiro de plantão surge com a idéia de "fazermos" pão-de-queijo. Como se você não fosse fazer tudo, desde ralar o queijo até colocar a assadeira no forno. Quando as indiretas ficam muito diretas, você fala logo que não vale a pena, dá muito trabalho e depois a maior parte da receita é desperdiçada.
Não aceitando a derrota, o ser em questão compra pão-de-queijo congelado, e vai assar ele mesmo. Depois de uma dica sua, ele faz o favor de ler as instruções na embalagem antes de começar a aventura.
– Tem certeza que vai colocar o forno no máximo?
– Sim, na embalagem diz que é pra assar na temperatura máxima.
– Pai, as instruções são pra fogão convencional, o nosso é industrial, esse forno é muito forte.
Ele não te ouve, você não insiste. Papai sabe tudo. E come os pães-de-queijo um pouco dourados demais por fora e um pouco cozidos de menos por dentro.
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Cada vez mais eu acho que a Terceira Guerra Mundial vai começar numa cozinha. E vai estourar por algum motivo de importância vital, como a sua recusa em seguir os palpites culinários de quem só sabe fazer miojo...
4 sussurros do além:
11 de julho de 2008 às 18:38
Ei, guarde pão de queijo pra mim... não o que seu pai fez, claro xD
12 de julho de 2008 às 12:19
Fiquei com medo de começar a ler os seus posts...rs
BLog dos Horrores e tudo e tal...mas não é medonho e isso é legal.
(e obrigada pela por passar lá no meu blog. é um prazer ser lida! rs)
17 de julho de 2008 às 13:30
hahahahahahaha... excelente... Me lembrou muito quando ainda morava com meus pais... ai, ai..
10 de agosto de 2008 às 03:58
Hahaha, muito bom.
Idêntico ao que acontece comigo.
Só que aqui em casa é quem estiver por perto mesmo. Mãe, pai, vó...enfim. Quem estiver no mesmo teto me inferniza na cozinha. Dá um nojo.
Dando palpites que eu já sei, desnecessários. Ou a maldita frase:
-Eu faço diferente!
Ahhh! Que vontade de dar uns tapas.
Ou ficam fazendo cara de nojo, ou me alcançando as coisas sem eu pedir, ou misturando. Que raiva!
Beijos, adorei o seu blog.
o/~
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